sábado, 30 de maio de 2009

Pelo Direito ao TGV!

É este magnífico dito que adorna vários cartazes da Juventude Socialista, espalhados por toda a Lisboa. Infelizmente, não consegui encontrar nenhuma fotografia do dito cartaz que postula tamanhas barbaridades, mas qualquer condutor ou transeunte que passe pela Alameda da Cidade Universitária por estes dias será presenteado com uma afirmação cujo autor, se mantivesse um mínimo de honestidade intelectual, justificaria a sua criação com um passeio do gato pelo teclado do computador, para não dizer algo pior e não emitir juízos de valor sobre a sanidade mental do próprio autor.

O direito ao TGV, devem pensar os jotinhas neo-marxistas, é um direito essencial. Todos nós, os jovens, os velhos e todos os que estejam no meio, temos direito a um projecto megalómano que foi decidido antes sequer de se levar a cabo qualquer tipo de análise custo-benefício (tal como o aeroporto, já agora, mas as implicações económicas, sociais e políticas dos dois projectos são totalmente diferentes, e isso agora não interessa para nada). Análise essa cujo concurso para a sua elaboração tem início cerca de 1 ano depois do projecto ter já sido confirmado publicamente. Tendo tido algumas cadeiras de política económica aplicada na minha licenciatura, tudo isto me parece muito estranho: mas então as análises custo-benefício não deveriam ser elaboradas com o intento de aprovar ou rejeitar um determinado projecto público? Assim sendo, o caso particular do TGV (e do Aeroporto) podem ser utilizados como fundamentos empíricos para duas teorias, alternativas mas não incompatíveis:
  1. Aquilo que se aprende nas universidades não passam de tretas teóricas, que não interessam sequer ao Menino Jesus (com todo o respeito para com este último).
  2. Estes senhores (os que confirmaram politicamente o TGV) nunca estiveram na universidade, ou se lá estiveram, não aprenderam nada. Ou talvez nunca tenham trabalhado numa empresa, fora da função pública, onde, tal como as torres de marfim teóricas das universidades enunciam, projectos deverão ser unicamente aprovados se os benefícios sociais excederem os custos sociais. Mas, e agora paremos um momento para pensar, não é para isto que uma análise custo-benefício serve?
Hoje, dia 30 de Maio de 2009, existe uma análise custo-benefício sobre o TGV. Não é um documento público. Foi encomendada pela RAVE (Rede de Alta Velocidade, a entidade gestora do projecto do TGV) a dois economistas portugueses que, não obstante não residirem em Portugal, são bem conhecidos nos meios académicos e universitários como sendo especialistas em análise de projectos públicos. Note-se que, se deste ponto em diante eu puder começar a dizer coisas um pouco menos simpáticas, não estou a colocar a honestidade intelectual e integridade académica destes dois senhores que elaboraram o estudo. Os seus méritos são amplamente reconhecidos internacionalmente. Colocarei em causa, contudo, todos os valores e tramas que pautaram toda a elaboração desta análise, do princípio ao fim. Ora, comecemos a dissecar o bicho.
  1. Como foi já referido, o concurso para a realização da análise custo-benefício é lançado depois (e aqui não interessa se foi uma hora ou dez anos) da decisão política ter sido tomada. Conhecem algum país não-africano onde coisas destas aconteçam?
  2. O concurso passa para as mãos da RAVE. Ora, quem é a RAVE? É um punhado de tecnocratas, engenheiros e economistas cujas actuais posições, na RAVE, dependem da realização do projecto do TGV. Por outras palavras, se não há TGV, não há RAVE, e se não há RAVE não há reformas e regalias para ninguém. Alguém sente o cheiro a queimado?
  3. RAVE encomenda então o estudo aos dois eminentes economistas acima mencionados. Estudo é realizado e "publicado" (como disse acima, não é público). Se foi sujeito a revisões por parte da RAVE, não sei, mas sinceramente gostaria de saber. Isto pois, aludindo ao ponto 2), não faria sentido à RAVE publicar uma análise que se opusesse à realização do TGV.
  4. Tive oportunidade de ler a análise. É uma análise bastante completa, realizada com a metodologia apropriada. Falha apenas num punhado de pontos: são tidas em conta hipóteses que, tivesse-as eu considerado num trabalho de 1º ou 2º ano de licenciatura e teria reprovado à cadeira. E são hipóteses cruciais para a avaliação do projecto: a criação de cerca de 60 mil postos de trabalho (caídos de onde, martelar a linha do comboio?), retornos fiscais de 64 mil milhões de euros em receitas (que ainda não percebi de onde vêm), e lamirés afins.
Tudo isto considerado, penso que, de facto, os jovens portugueses dever-se-iam unir em torno da JS para defender um direito essencial: o direito a maus projectos públicos, realizados da forma menos transparente possível, que geram receitas fiscais saídas da cartola, assim como dezenas de milhares de postos de trabalho sem ninguém saber como. Projectos que resultam de "compromissos políticos", ao invés de análises sérias de impacto em termos económicos e sociais. Projectos que aumentam a já galopante dívida externa portuguesa, permitindo depois a cada cidadão pagar €100 para ir de comboio a Madrid (esperem, não posso já fazer isto de avião?). Pelo direito a estes projectos!

6 comentários:

  1. A JS anda a cometer calinada atrás de calinada. Lançaram-se ao Paulo Rangel de uma maneira desprezivel.
    Enfim, sobre essa história do TGV pouco há a dizer. Há um lobby pela construção em Portugal, neste país só se sabe contruir e só se faz força para construir. Aliás, a única coisa que não se constrói em Portugal é um país de jeito.

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  2. Um ligeiro apêndice ao post: Note-se, também, que o preço proposto por viagem de ida, apenas, são €100, o que implica ida e volta de Madrid por €200. Ora, Madrid é o destino com o qual o aeroporto de Lisboa mantém mais ligações regulares (ou seja, com o qual todo o país mantém ligações aéreas mais regulares), sendo essa rota servida por 5 companhias: TAP, Iberia, Vueling, Clickair e easyJet. Três destas últimas são low-cost, e a easyJet oferece ida e volta por €30 (+€22 para os cavalheiros que desejem levar bagagem). Mesmo a TAP e a Iberia, que não sendo low-cost, se esperam mais careiras oferecem ida e volta por €66. Penso que o diferencial de preço, velocidade e comodidade compensa o único handicap das ligações aéreas em relação ao TGV: a distância de Barajas ao centro de Madrid. Esta questão nem se coloca para Lisboa que tem o seu aeroporto, a bem dizer, no centro da cidade (só não lá chega mesmo o Metro).

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  3. Um pequeno completo ao teu apêndice: já está em construção o prolongamento do metro até ao (actual) aeroporto de Lisboa!

    Já há algum tempo que também tinha reparado no dito cartaz e apesar de serem socialistas, não queria acreditar que uma jota pudesse, não só ser a favor de se hipotecar assim o futuro do país, como também fazer disso uma das suas bandeiras!

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  4. "não queria acreditar que uma jota pudesse, não só ser a favor de se hipotecar assim o futuro do país, como também fazer disso uma das suas bandeiras!"

    Quantos exemplos queres disto? É que tendo em conta o pessoal que já passou por certas jotas... lol

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  5. Sim, também tens razão. E eu sei que as jotas estão cheias de boys e girls à espera de algum tacho. Mas mesmo assim, num assunto tão sério quanto este, a minha primeira reacção é sempre de estupefacção. Faz-me impressão que com a idade que têm, já façam tão parte deste sistema partidário e não queiram saber do futuro do país para nada. Os partidos deviam servir o país, não o contrário. Se com 20 anos são assim, aos 40/50 isto vai ser uma alegria (ainda maior)!

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  6. Meu caros, este semestre fiz um projecto de avaliação do TGV para uma das minhas cadeiras na faculdade e queria só ilucidar a questão das receitas. De facto segundo os estudos da RAVE as receitas superam os custos(nada suspeito!), sendo que estas receitas englobam as receitas de bilheteira, os custos evitáveis na rede ferroviária convencional (como a reestruturação da rede, etc.), as receitas em ganhos de tempo (tendo em conta o encurtamento das viagens, principalmente na ligação Lisboa-Porto) e externalidades (tipo os efeitos ambientais como a redução de emissões poluentes, efeitos na segurança rodoviária como a redução da sinistralidade, e efeitos no mercado de trabalho), e contabiliza ainda os incrementos de produção principalmente pelo transporte de mercadorias. Estas são algumas das receitas incluídas nos estudos, agora se os valores estão bem contabilizados isso eu duvido, pois como O Agitador disse e bem - não há TGV, não há RAVE e sem RAVE não há regalias para ninguém! Boas para voçês e força no blog ;) (ps: Pedro eu vou descobrir qual és tu :P *)

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