Após uma leitura atenta do livro “ Portugal, Hoje: O Medo de Existir” de José Gil, constatei que o autor tenta enquadrar toda uma série de características tipicamente portuguesas, embora estereotipadas, num contexto histórico, político e psicológico.
Isto é, tenta explicar diversas características da personalidade base portuguesa através dos acontecimentos histórico-políticos que marcaram física e psicologicamente a vida da nação.
Assim, para José Gil, o facto do português ser sonhador, idealista, sentimentalista, individualista, supersticioso, crente na sorte e nas soluções milagrosas, o facto de gostar de ostentar o luxo e a riqueza, de ter propensão para evitar todo o tipo de conflitos e para se desresponsabilizar, de ter uma enorme capacidade de adaptação, assimilação e tolerância, o facto de ser detentor de um enorme sentido de ridículo e de um forte espírito crítico, assim como o horror desmesurado que tem pelas opiniões alheias...não são mais do que consequências de um nevoeiro inconsciente, provocado por acontecimentos históricos mal digeridos como a Batalha de Alcácer Quibir e o Salazarismo, que nos tolda o espírito impedindo-nos de agir e de nos inscrevermos.
Em primeiro lugar, e com todo o respeito para com um dos 25 maiores pensadores do mundo inteiro eleito pela revista “Le Nouvel Observateur”, considero que José Gil não foi feliz ao generalizar os Portugueses; em segundo, não partilho da opinião que a personalidade dos portugueses resulte apenas de factos históricos marcantes, pela negativa, que não foram bem exorcizados no seu tempo e que por isso se entranharam inconscientemente na personalidade dos portugueses passando assim de geração em geração.
Para mim, a personalidade portuguesa é um misto de diversos factores e elementos culturais herdados de um riquíssimo passado histórico marcado pela interacção com as mais variadas culturas. Desde os povos do Norte da Europa, Mediterrâneo e Norte de África, passando pelos povos oriundos dos novos mundos da época dos descobrimentos, culminando agora com a entrada para a União Europeia.
A cultura, e consequentemente a personalidade dos portugueses, não é muito mais do que essa mistura de genes e culturas com as mais variadas proveniências. Costuma-se dizer até que o gene português é um gene raro e único devido à enorme miscelânea de ascendência que contém.
Assim, o facto dos portugueses serem desta ou daquela forma não resulta apenas de acontecimentos traumáticos e mal resolvidos do passado. Não querendo com isto tirar-lhes a importância que tiveram, não há dúvida que a Batalha de Alcácer Quibir e o Salazarismo deixaram marcas profundas entranhadas no espírito e pele dos portugueses, apenas acho que é errado apenas focar esses dois acontecimentos negligenciando todas as interacções riquíssimas que a nossa situação geográfica e o espírito aventureiro e destemido dos portugueses nos proporcionaram enriquecendo de maneira única nossos genes e, consequentemente, a nossa personalidade.
Outra das críticas que tenho a fazer ao livro de José Gil é o facto de ele se concentrar apenas no lado negativo das coisas. Os portugueses são invejosos, cobardolas, aceitam sem protestar as decisões incoerentes dos governos, não têm voz, têm uma cultura geral a rojar o chão, o tamanho do seu pensamento é pequeno e proporcional ao tamanho do país, criticam o país sem apresentarem nem tentarem arranjar soluções e toda uma vasta lista de aspectos negativos.
De facto, é verdade, todos os aspectos e características apontados por José Gil no seu livro correspondem, de uma maneira ou de outra, após uma observação cuidada do comportamento dos portugueses, à realidade. Contudo, na minha opinião, não é uma verdade colectiva, não podemos cair no erro de generalizar. Pois os “defeitos” de uns não têm que ser necessariamente o “defeitos” de outros. Não querendo com isto desresponsabilizar-me ou excluir-me de um todo do qual me orgulho, que é o ser portuguesa.
Para além disso se uma das nossas características mais singulares é um estranho sentimento ao qual chamamos saudade, não é com este tipo de livros que nos desacreditam que vamos erguer a cabeça, andar para a frente e deixar de suspirar por glórias passadas. Não acredito neste “acordar para a vida” tão negativo, os portugueses precisam de incentivos positivos, precisam de ter orgulho no seu país, precisam de ter um sentimento que tanto invejo aos Norte-Americanos que é o patriotismo, não aquele patriotismo de extrema direita, mas sim um patriotismo saudável, orgulho em ser português e ambição de fazer mais pelo país e ser reconhecido pelos seus.
Gostava de ver os portugueses com orgulho nas suas raízes, na sua cultura, portugueses que acreditam que o país tem futuro, gostava também que publicassem livros e editassem artigos que em vez de nos deitar a baixo nos elevassem, e que nos mostrassem a luz ao fundo do túnel.
E José Gil, com toda esta negatividade, acaba por se rever no que escreve, não passa de mais um daqueles portugueses que criticam mas que não apresentam soluções, aliás, que se desresponsabilizam passando essa “tarefa” para a mão dos governantes. Afinal, quem é José Gil, se não mais um daqueles portugueses “chico-espertos” que gostam de falar, mas quando chega a altura de agir, enterram a cabeça na areia e passam a responsabilidade para os políticos, políticos esses a quem designam de incompetentes?
Se José Gil tem vontade de alertar os portugueses para o perigo do nevoeiro, se quer ter o papel de Messias que vai salvar a nação dos perigos da não-inscrição, então podia começar ele próprio por apresentar soluções claras e coerentes. Como dizia Mahatma Gandhi “ Devemos ser a mudança que queremos ver no mundo”.
Em jeito de conclusão, e apesar de todos os comentários acima, achei bastante interessante o modo com José Gil abordou e explicou a personalidade dos portugueses recorrendo a factos histórico-políticos traumáticos do passado, confesso até, que nunca me tinha ocorrido pensar Portugal e os portugueses desse prisma.
Considero também que José Gil tem uma linha de pensamento bastante coerente e lógica, que nos leva a reflectir sobre nós e a nossa maneira de estar no mundo, contudo acho que o autor se concentrou mais numa crítica à sociedade e à política portuguesa, do que propriamente numa análise e reflexão dos motivos que nos levaram a desenvolver esta personalidade tão única em diversos aspectos, dos quais apenas menciona os menos positivos.
Considero também que José Gil tem uma linha de pensamento bastante coerente e lógica, que nos leva a reflectir sobre nós e a nossa maneira de estar no mundo, contudo acho que o autor se concentrou mais numa crítica à sociedade e à política portuguesa, do que propriamente numa análise e reflexão dos motivos que nos levaram a desenvolver esta personalidade tão única em diversos aspectos, dos quais apenas menciona os menos positivos.
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